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Entrevista | Quem tem causa nunca fica no passado, diz Décio Lima sobre Lula

Por: Marcos Schettini
27/02/2021 17:21
Lúcio Bernardo Jr./Câmara dos Deputados

Ex-prefeito de Blumenau, ex-deputado federal e candidato do PT ao Governo do Estado em 2018, Décio Lima tem um papel importante no cenário nacional da sigla lulista. Quando na Câmara dos Deputados, presidiu a importante Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, na época, foi figura que avançou na aprovação de pautas necessárias para o Brasil.

Presidente do Partido dos Trabalhadores em Santa Catarina, o advogado de 60 anos concedeu entrevista exclusiva ao jornalista Marcos Schettini e falou do futuro eleitoral em 2022, do cenário nacional sob Bolsonaro e fez uma análise da conjuntura catarinense. Confira:


Marcos Schettini: Quem é o PT hoje?

Décio Lima: O PT acabou de completar 41 anos no dia 10 de fevereiro. Portanto, tem a maturidade de um partido que possui raízes, experiências com derrotas e vitórias, mas que, fundamentalmente, não perdeu sua característica de ser democrático e comprometido com a defesa da soberania nacional e como uma vida digna para todos e todas. O PT hoje é o grande depositário da esperança do povo brasileiro, da recuperação do estado de direito, da reconquista novamente e infelizmente dos valores da democracia, e de poder tirar o Brasil deste ambiente excludente e de ódio, de mentiras que a cada minuto e a cada segundo leva o nosso país a tragédias que não imaginávamos que a história iria nos permitir. Portanto, o PT tem um projeto nacional e é o único partido que neste momento reúne uma biografia que se estabeleceu como marco regulatório da nossa própria história. Os números daquilo que aconteceu no período da presidência do presidente Lula e da presidenta Dilma são a prova real, cartesiana e incontestável de que foram os melhores momentos pra economia e para o povo brasileiro. Essa biografia nos pertence. E essa biografia ela é um projeto novamente para trazer esperança ao nosso povo.


Schettini: O partido saiu atropelado do Poder. O que ocorreu?

Décio Lima: Não foi o PT apenas, como você usou na frase, atropelado no poder. O que aconteceu foi uma agressão ao estado de direito e a democracia. Não foi só o PT que foi agredido nesse processo, mas foi um conjunto de valores que custou as gerações nesse país podermos alcançar que foram as liberdades democráticas e um estado de direito construído na luta do nosso povo que ficou infelizmente submetido há 21 anos de arbítrio e de ditatura. Eles não atropelaram o PT, atropelaram valores e as instituições que construíram esses valores no modelo republicado. Portanto, não foi uma agressão somente ao PT, mas foi uma agressão às instituições e, principalmente, à democracia brasileira. Além disso, está cada dia mais evidente, inclusive para a maioria da população que foi enganada, os motivos do afastamento de Dilma e a prisão do Lula: o projeto de poder que aí está afrontando a democracia, a soberania nacional e a política de inclusão social através de investimentos maciços em saúde, educação, infraestrutura, empregos, renda, produção e consumo. Enfim, o Brasil que chegou ao posto de 6ª economia mundial, hoje volta ao patamar anterior sendo chacota no mundo. Isso é visível no dia a dia da vida das pessoas e empresas. Então, desde abril de 2016 nosso país está sofrendo com o rompimento das regras democráticas e jurídicas que interromperam o governo de forma irresponsável.

Schettini: As eleições municipais derrotaram os extremismos?

Décio Lima: As eleições municipais de 2020 mostraram claramente a situação de fragilidade da democracia brasileira e de descrença no processo democrático em razão das agressões que a política vem sofrendo nos seus ataques sistêmicos produzidos por um procedimento de negação as instituições e ao estado de direito. Onde está a certeza dessa afirmação que faço? Nos números. Nós vivemos nas últimas eleições a maior abstenção da história das eleições desde o período da década de 80 quando reconquistamos a democracia. Muitas cidades os candidatos ou mesmo aquele que ganhou as eleições foi derrotado pela maioria dos votos nulos, brancos e abstenções. Isso é grave porque há uma negação que cada vez mais aumenta na política e uma negação a própria democracia. Essa crise, entretanto, não é só no Brasil, é uma crise da democracia no mundo todo. E essa é uma tarefa de todos aqueles que acreditam que ainda para a humanidade o melhor caminho é a vida democrática que foi construída, principalmente, com base no atual modelo republicano.


Schettini: O extremismo do PT não assusta o eleitor do centro em direção à extrema direita?

Décio Lima: O PT nunca foi extremista. O PT governou e governa várias cidades em Santa Catarina. Governou e governa vários municípios e Estados. Governou o Brasil por 13 anos. Nossa prática nunca foi extremista. O PT é um partido que se construiu no processo plural da democracia neste período que já estamos vivendo por 41 anos. Se defender a democracia, defender os pobres, defender os trabalhadores, ter um compromisso com a inclusão social, com o estado social, com o aprofundamento da divisão de riqueza e de garantias que esse país seja de todos; se isso é ser extremista eu sinceramente quero dizer a você que este rótulo eu recebo com maior carinho como petista. Mas isso não é extremismo. Extremismo é um governo, por exemplo, que nega a vida. Um governo que passa ter uma marca de um governo genocida, um governo que combate claramente as instituições e o estado de direito, que defende milícias, que faz afirmações desprezíveis do ponto de vista dos valores humanistas, que levanta armas, manda o povo se armar como se isso fosse a saída para a construção de qualquer caminho de felicidade. Isso sim é extremismo. Extremismo é esse ódio que foi implantado em nosso país. O PT é justamente o contrário disso tudo, pois, defende a paz, a solidariedade, o amor, a divisão justa das coisas, a dignidade do trabalho, a dignidade de ter uma casa própria, de ter saúde, enfim, o estado social. Este é o caráter do PT, portanto, um partido de equilíbrio em que já mostrou isso governando nosso país e vários lugares do nosso Brasil um modelo do pacto federativo, ou seja, prefeituras e governo do estado, do maior partido hoje do Brasil, a maior bancada de deputados federais e maior número de governadores. Então, um partido que tem tido o bom senso de equilíbrio no processo de governança para todos.


Schettini: O PT votou pelo impeachment do governador Moisés e agora parece da base. Por que?

Décio Lima: O PT não é base desse governo. O PT tem tido uma atitude em direção aos interesses do povo de Santa Catarina que já mostra que nós não somos um partido de extremos de fazer oposição por oposição. Nós somos oposição, temos um conteúdo diferente, mas nós também queremos o bem para Santa Catarina. Infelizmente, o atual governador e vice foram eleitos na onda nacional sem projeto para Santa Catarina. E, após quase três anos, não conseguiu elaborar um rumo. Então, nossa bancada na Alesc, dentro do contexto da atual composição do parlamento, tem se posicionado de forma responsável atuando e propondo ações que possam amenizar essa falta de horizonte que o governo estadual representa. No processo de impeachment, a bancada não foi leviana como muitas vezes alguns são contra o PT. Por fim, é só olhar a quantidade e conteúdo de leis e projetos que chegam ao parlamento para verificar a falta de iniciativa governamental. O governo Moisés é um governo que já acabou não vejo perspectivas neste governo. A negação da política aqui em Santa Catarina com a eleição do Moisés revelou o fracasso do que é. Se negar os aspectos do processo político existente com conteúdo histórico e tentar-se um caminho daquilo que é praticamente incapaz de produzir valores na complexidade que é a própria política. Portanto, nós vamos ter o cuidado com o povo de Santa Catarina porque não somos daqueles que quanto pior melhor, mas vamos construir como partido novamente uma possibilidade para o povo catarinense fazer uma opção no processo democrático de 2022.

Schettini: Quais são os desafios para uma coligação no ano que vem?

Décio Lima: O grande desafio para se construir uma coligação uma aliança política em Santa Catarina é o seu conteúdo e também aqueles que estão neste momento protagonizando a política no estado. Em todos os partidos essa pluralidade. Infelizmente partidos dos quais eu tenho muito respeito por defender o estado de direito, a soberania nacional, minimamente são pautas que nos aglutinam, preferiram caminhos do fisiologismo, do toma lá dá cá, do imediatismo, aquilo que ficou conhecido visivelmente como o Centrão nos últimos anos, com base, com referência no Congresso Nacional. Esse vai ser o grande desafio, inclusive, da política de um modo geral. Ou os partidos vão se aglutinar dentro de um propósito de conteúdo um programa para Santa Catarina como ocorreu historicamente ou eles vão fazer um processo voltado aos interesses que são, inclusive, escusos na boa política que são os interesses que a gente conhece do fisiologismo e do toma lá dá cá. Essa vai ser a grande dificuldade de aglutinação. Esse é um momento que teríamos que ter grandeza de uma pauta que esteja como centro da defesa da democracia, do estado de direito e da vida das pessoas que SC e que todos, em grande parte os partidos com essa característica histórica, pudéssemos aglutinar. O PT não terá dificuldade de estar num espaço desse, entretanto, eu vejo que a dificuldade são daqueles que estão protagonizando de forma equivocada no momento da política em SC.


Schettini: O PT não deveria ficar fora da disputa nacional em nome de uma unidade?

Décio Lima: O momento que o PT deixará de ser o maior partido da esquerda nacional ele poderia ficar numa situação secundarizada. O problema é que você vê que todas as pesquisas que se faz os nomes com maior alcance são os nomes do PT, o Lula e Haddad. Como vai se pedir para ficar de fora com a expectativa que se tem de ganhar as eleições. A política nesse momento tem que perder esse processo da vaidade personalista de algumas figuras da vida pública nacional. O PT tem uma base estrutura na sociedade brasileira. Tem uma biografia como aqui já disse, estabeleceu um marco regulatório na nossa história. Na verdade, em síntese, é aquilo que sobrou para poder deixar esse período, eu diria, macabro. Que vem ocorrendo desde abril de 2016, que fez esse processo de ruptura traumática, jogando no lixo o estado de direito e a democracia. É o PT que está aí pra poder produzir a recuperação desse tempo que infelizmente foi perdido.


Schettini: Lula da Silva já não é um passado para ser novamente futuro?

Décio Lima: Quem tem causa nunca fica no passado. Quem tem causa vive com ela e morre com ela. Vive o tempo todo no processo de dedicação a sua luta e essa luta está presente na vida do povo brasileiro. Eu gostaria muito que o Lula fosse algo do passado, o problema é que a forma como o Brasil está sendo conduzido, é um passado que nós pensávamos que jamais voltaria na história do Brasil e da humanidade. Que são os valores do ódio, da mentira, da exclusão e deste fascismo que tomou conta infelizmente do nossos país. Isso sim é o passado. O Lula é a esperança, é o futuro e isso não pode ser tratado no tempo ou na idade, isso tem que ser tratado como valores. Gerar empregos, fazer a economia crescer, continuar as políticas sociais de dar casa pra quem não tem, como o Minha Casa Minha Vida, de garantir as universidades para todos, de garantir a ampliação a saúde pública, de construção de um país que teve a maior pauta de obras humanas na América Latina e talvez até no mundo. Isso não é passado, isso é o futuro que nós precisamos novamente retomar para que o Brasil saia deste atraso terrível, desta pauta antinacional, de pilhagem do nosso patrimônio e de exclusão. Uma pauta mentirosa, enganadora, traiçoeira que se estabeleceu desde o período do golpe de 2016 e que foi intensificada de forma agressiva com essa onda desse genocida que infelizmente ainda governa nosso país.


Schettini: Vai haver confronto armado em 2022?

Décio Lima: O único confronto armado que pode ter no nosso país são os das milícias. Aliás, não vai ser em 2022, já está acontecendo. Onde está Marielle, os desaparecimentos de várias pessoas que tem sido objeto de notícias. Esse é um processo já em curso no nosso país. O mau aqui está banalizado. Este é um confronto de manhã, tarde e noite visível na sociedade brasileira. Nós não fizemos parte disso porque nós acreditamos na paz, no amor, na solidariedade, nós defendemos a vida como nenhum outro partido defende, principalmente neste momento de crise sanitária. Esse confronto lamentavelmente existe e eu acredito que em 2022, com a nossa vitória na Presidência da República, nós vamos interromper a possiblidade do agravamento deste processo contra o povo brasileiro e estabelecer um ambiente de paz, de ternura e de muita solidariedade.


Schettini: O Brasil que sair das urnas, não é um estopim?

Décio Lima: Eu vejo como a única saída as urnas, a democracia e o respeito pelo seu resultado. Entretanto, nós temos que recuperar a crença de ontem do povo brasileiro com a democracia. Nós temos que fazer com que o povo brasileiro participe com intensidade no processo democrático. É a única forma de nós lapidarmos a democracia brasileira. Não há outra saída senão através do processo democrático. Eu sou um democrata por natura e acredito na democracia e que jamais ela será um estopim. Ela é sim o campo de solução para que nós possamos harmonizar definidamente as relações democrática, as instituições e a vida do nosso Brasil. Precisamos eleger um presidente democrático, que una o país em torno de um projeto que permita todos e todas voltarem a ter perspectiva de futuro. Chega de irresponsabilidade, incompetência e negacionismo.

Schettini: O Sr. é candidato a governador?

Décio Lima: Ainda não iniciamos internamente esse debate das candidaturas das eleições de 2022. Estamos numa fase de reorganização interna, de aglutinação, de estabelecer um processo de unidade e também de fazermos as interlocuções que são imperiosas numa política de alianças. Já demos saltos qualitativos nesse processo, como foi o exemplo de Florianópolis, e acredito que nós vamos avançar para termos uma frente democrática em Santa Catarina, dos quais, não só PT, mas vários partidos poderão e deverão se aglutinar para apresentar um projeto consistente, confiável e que toque o coração do povo de Santa Catarina. Isso tudo é importante, muito mais importante que alguém se afirmar neste momento com qualquer candidatura. Portanto, vamos primeiro cumprir essa tarefa para depois pensarmos naqueles que poderão protagonizar.


Schettini: O que a pandemia revelou?

Décio Lima: A pandemia revelou algo muito perigoso para nosso país: o negacionismo. As pessoas que negam a ciência e com isso vulnerabilizam a vida. As pessoas se revelam totalmente irresponsáveis, como é esse presidente da República com a vida daqueles que ele deveria estar cuidando. O pior é que isso contamina o pensamento. Essa movimentação de um presidente da República numa direção com mentiras como a cloroquina e todos esses processos que são muito obscuros, porque visivelmente se revela interesses econômicos e laboratoriais e, portanto, estão no limite de serem criminosos, inclusive. A pandemia revelou esse caráter infelizmente sujo desta onda fascista que tomou o coração de muitos brasileiros bons. Revelou o despreparo, incompetência e fragilidade do governo Federal e Estadual, especialmente. Mas eu acredito que todos temos recuperação. Eu acredito que o Brasil sairá mais forte dessa pandemia. Ela também está ensinando para todos nós a importância da solidariedade e do cuidado com a vida e não com as coisas. De valorizar o tempo, de pensar em valores que são os que nos mantém vivos do ponto de vista da existência da humanidade, valores do amor, carinho e da confiança, de que nós haveremos de construir um mundo ainda melhor. Então, eu acredito que o Brasil vai sair ainda mais forte, embora a indiferença de um governo que é responsável sim, direto, porque hoje nós poderíamos ter muito menos contaminação e menos mortes se nós tivéssemos um governo que produzisse um estado social e preocupado com a vida. Mas mesmo com tudo isso, com este crime, nós vamos sair muito melhores. Essa dor vai nos ensinar, com certeza, a sermos maiores do ponto de vista dos valores humanistas.


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